sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

Taças

Costumam ser duas
mas hoje, é aquele dia
que tem só uma.
E não tem problema nisso.

O vinho veio do Chile
de uvas de antes do caos.
Esperavam, certamente
uma celebração nos anos
que se prepararam para hoje.

Espero que tenham pego algo
desse caos pelo caminho.

Sem alarde, sem cerimônia
esvazia-se a garrafa
enche-se a taça.
Mesmo só, ainda assim
preservo a dignidade.

Afinal, as vezes, um dia só
cai bem.

E não tem problema nisso.

Afinal, amanhã, ou depois
entre o hoje e o para sempre
teremos tempo.


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Onishiroi Shonin

segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Quase natal

É segunda, um dia útil, e normal.
Normal no sentido de todos os dias,
ou seja, estranho, incomum,
mas, como os outros, igual.

Um dia que andei sob o sol
e em parte, sob a chuva.
Tenho comigo um conjunto de coisas
que servem para todo momento.
Alguns papéis importantes
outros irrelevantes
e um guarda-chuva, mesmo que
tenha amanhecido com sol.

O tempo muda por aqui.

No meio da semana tem um feriado.
Um dia de feira não-útil.
É uma celebração importante
me falaram.
Dia de união, dia sagrado,
dia de deuses nascerem.

Não que eu não aprecie o momento.
Como tantos outros, passo
na companhia de quem gosto
com bebida e comida.
Talvez celebrando coisas diferentes
mas uns aos outros, em comum.

Depois da celebração, como todos
todos os anos que lembro
sei que ficarei na janela
ao lado de meu querido pai
com uma caneca na mão.
Apreciaremos a companhia
um do outro.
Faremos isso
enquanto olhamos a rua
e vemos as pessoas que logo
fogem da companhia dos seus.

Dias úteis, sagrados, ou outros.
São dias normais,
iguais,
mesmo que diferentes.


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Onishiroi Shonin

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Insegurança, ft. Hailie Furtuozo

Queria fazer origamis
ou qualquer outra coisa
pequena, suave e bela,
te fazer sorrir.

Queria compor um poema
que talvez abrisse a porta
e transformasse em lágrima
a dor que se fecha sólida
tirar de você a mágoa.

Ah, bobo que sou.
Se agora nem meu toque
parece te trazer algo bom
e com as palavras da voz
me pede distância.

Neste momento,
não penso em nada além
dessa dor
que não minha.

Tentei, na minha solidão
te dar o espaço.
Mas enquanto busco silêncio
nas palavras de um livro
e na batida de uma música
minha mente continua com você.

Com a sua dor.

Não sei o que aconteceu.
E mesmo se perguntar
você não dirá se fui eu.

Por essa noite tão vazia
minha mente vaga
procurando uma saída
pra essa insuficiência minha.


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Onishiroi Shonin & Hailie Furtuozo

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Sem penas

Ouço novamente o bater de asas.
O som repetitivo, mecânico, monótono,
as asas de Uriel anunciando
paz, em sua forma final.

Olho para cima com calma, sem medo.
Sei que deveria, como meus amigos,
sair correndo, buscar abrigo,
ficar em casa.
Mas também preciso procurar emprego.

Vejo a forma negra no céu,
seteiras de anjo apontadas
procurando, julgando, executando.

Ouço o bater de asas de Uriel
e o som seco, que ecoa na favela.
Mais um dos meus iguais
para sempre em paz.

Cancelaram as aulas,
pois os vivos
ainda estão em guerra.



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Onishiroi Shonin

domingo, 1 de dezembro de 2019

3000 versos

Os 3000 versos que dentro de mim
se agitam, querendo sair, querendo ser
borboletando na barriga, lutando
para se encontrarem, formarem poesia.

Os 3000 versos que a cada olhar
sem um aviso em mim coloca.
Versos, filhos do seu toque, jeito,
versos que me agitam, me acordam.

Os 3000 versos que, tempestade e caos
me lançam nas pedras, me obrigam ao papel
e então me largam, tímidos, sem querer
sair de mim, apenas se esconder.

Os 3000 versos, que dia a dia, um a um
tiro de dentro da barriga para sobre o papel
para que, depois, com um único olhar,
você os recrie em mim, eterno borboletar.


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Onishiroi Shonin