quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Star wars Rogue one – Review (SEM spoilers)



Star Wars Rogue One talvez seja o filme que você sempre quis ver em star wars, ou talvez seja o exato oposto. É um grande filme, sim. Não o melhor filme, embora tenha seus momentos. Definitivamente um filme que vale a pena ser visto, seja você fã da saga ou não. Contudo, talvez pela abordagem mais séria ou por sua história bem distinta das quais já estamos acostumados, ele não atinja todos da mesma forma. É importante que fique claro: Rogue One é uma história diferente de todas as outras já contadas.
Todos que já viram os filmes originais de star wars sabem que a estrela da morte existe, e que é destruída graças a um ousado plano de ataque rebelde, que só pode ser realizado graças a vários “Bothan spies” que morreram para conseguir os planos da base. Bem, talvez este seja o primeiro ponto que me incomodou no filme. Acredito não ter visto nenhum Bothan. Mas eu divago. Rogue One acerta em vários outros pontos, efetivamente corrigindo o que muitos sempre consideraram falhas no Uma nova esperança. Explica-se o porque do ponto fraco da estrela da morte, entre vários outros pontos interessantes. Mas essa é a parte do filme que você já sabe que vai encontrar antes mesmo de sair de casa para ir ao cinema.
A parte realmente excelente de Rogue One é mostrar a aliança rebelde de uma forma que até então não havíamos visto. Uma aliança conturbada e suja, com personagens que discordam entre si, com métodos diversos. E, principalmente, com um histórico tão tenebroso como... bem, como rebeldes costumam ser. Afinal, o império os denominou terroristas, dos tais que justificassem a construção de tal poderosa arma. E neste filme vemos um pouco disso. Homens e mulheres dispostos a realizar atos não tão heróicos para o objetivo de vitória da rebelião. Mais que isso, Rogue One tem a liberdade de mostrar um lado que não tivemos acesso da galáxia. O lado no qual os rebeldes e o império lutam de verdade, com baixas em ambos os lados (e stormtroopers que acertam até com certa regularidade). Ah, e eles acertaram as joelheiras dos stormtroopers.
Uma questão gerada por esta abordagem é que este filme é definitivamente mais pesado que os outros até então. Mesmo com as eventuais brincadeiras e alívios cômicos, o filme é tenso. O conflito é uma constante, blasters parecem soar por quase todo o filme e, de forma geral, sente-se uma tensão que não havia nos filmes anteriores. Um enorme feito, uma vez que já sabemos o final desta história quando ela começa.
Se o clima do filme é seu ponto alto (para quem estava como eu ansioso para assistir esse lado da história), a execução me deixou alguns desagrados. A velocidade e o conflito constante torna difícil sintonizar com e entender bem as personalidades envolvidas. A maioria dos personagens principais até descreve relativamente bem suas motivações, mas isso ocorre de forma meio forçada e mecânica, sem grandes momentos de interação calma e pacífica para vermos sua sintonia, como ocorre por exemplo em guardiões da galáxia. Por estarem quase sempre em uma situação extrema, vemos mais a forma como eles resolvem seus problemas do que a razão de serem da forma que são, e assim é difícil efetivamente importar-se com o que vai ou não ocorrer com cada um. O fato de estarem em uma situação que envolve muitos extras ao seu redor também ajuda em impedir essa sintonia, pois sempre existe algo mais ocupando nossa atenção e impedindo de focar em um ou outro personagem.
Aliás, falando em focar. Como habitual, o 3D, pelo menos o padrão, é péssimo. Não posso falar pelo real 3D ou pelo IMAX, mas se for escolher, prefira a película convencional. Apenas serviu para tornar o foco pior, como normalmente ocorre em filmes que não foram 100% focados no efeito 3D.
As atuações são “ok”. Alguns atores são excepcionais, outros nem tanto. Não tivemos desta vez uma atuação absurdamente incrível como a de Boyega, mas tivemos uma média bem boa. A personagem principal deixou um pouco a desejar na minha opinião, ao menos nos momentos de maior emoção. Alguns outros personagens (inclusive o dróide) por vezes roubavam a cena dela, mas isso pode ser tolerado.
Como ocorreu com o último filme, Rogue One consegue ter um elenco sem cor definida, com caucasianos, mestiços, asiáticos e negros espalhados de forma que qualquer um que diga que o filme tem “cotista” está precisando rever seus conceitos. Também existe uma prolixidade de sotaques, extremamente válida para um grupo tão diverso.
O filme encaixa vários cameos ao longo da história, muitos deles bem colocados. Assim como no filme do ano passado, quem está ciente dos outros enxergará um fan service, e quem não viu nenhum filme não os estranhará como cenas excessivamente forçadas (ao menos, não em sua maioria). Como todos já viram no trailer, sim Darth Vader aparece e sim, ele é foda nesse filme.
Aliás, muito foda. Talvez a melhor cena dele em toda a história esteja nesse filme. Isso vocês me dizem depois quando spoilers forem permitidos.
Os efeitos são limpos e bem feitos, sem nada muito forçado. É especialmente digno de nota que alguns personagens foram feitos inteiramente por CGI uma vez que envolvem pessoas que aparecem no IV e ou estão em outro plano de existência ou não possuem mais a mesma aparência da época, e estes efeitos foram feitos com qualidade que creio que uma pessoa não obcecada por efeitos e que não saiba de antemão quem foi feito desta forma não perceba. Apesar de que, obviamente, a “atuação” destes personagens é de longe “inferior” a média do filme.
O filme também é rico em pequenos detalhes, que podem passar despercebidos. Vários momentos envolvem reações sutis que fazem sentido se estiver prestando atenção, e eles tornam muitas cenas mais interessantes e críveis. Esteja atento.
Agora, tomando por outro ponto, Rogue One tem uma grande vantagem. Não é somente um filme de star wars. É um filme de guerra. Nesta linha, Rogue One não deixa nada a dever para o típico exemplar da espécie. Isto considerado, também possui cenas de ação extremamente bem feitas, sem o uso de movimento rápido de câmera para realizar a ação. As cenas são bem feitas, em sua maioria críveis e adequadas. Qualquer fã de ação ou de filmes de guerra convencional se sentirá a vontade com este filme, assim como o típico fã de star wars. O mais interessante, contudo, é sua conclusão diretamente conectada ao filme IV. Bem verdade, se o filme não exibisse os créditos e continuasse diretamente no IV poderia enganar alguém como um único filme... bem, salvo a qualidade de imagem, claro. Para quem NUNCA viu nenhum star wars, eu recomendaria agora começar por este, que torna a história de Uma nova esperança mais... tangível.
Por fim, na lista de efeitos sonoros... bem, não acho que vá ganhar um Oscar neste quesito. A trilha sonora original é interessante, mas não possui o tom épico esperado. Claro que competir com Jhon Willians é complexo mas... a trilha sonora tenta aproximar-se da original o bastante para incomodar. Por vezes escuta-se um arranjo que remete a alguma música antiga e então percebe-se a diferença. Sinto que seria melhor ter algo completamente original ou algo completamente igual. Tentar ter a referência sonora do original talvez tenha sido um erro.
Como recomendação geral? Veja o filme. Se ele não é tão grandioso quanto foi o Despertar da Força, é muito mais crível que este. Considerando minha irritação com a quantidade de momentos em que a barra foi forçada no filme VII, Rogue One é um agradável alívio em um filme que em sua grande maior parte faz sentido. Um bom filme, digno de ser visto no cinema, mas não um magnífico filme para fazer as pessoas chorarem de saudade.

Ja-ne. Nenhum espião bothiano foi ferido neste review.

______________ Onishiroi Shonin

sábado, 25 de junho de 2016

Troopers da morte – Resenha



Recentemente (tipo, ante-ontem) acabei de ler o livro Troopers da morte. Um livro da série legends no cenário de Star Wars. Para quem não sabe, a designação “legends” informa um livro ou conteúdo no cenário de Star Wars que não faz parte da história “oficial”, também chamada de cânone. O livro tem a assinatura de Joe Schreiber, autor habitual de livros de horror. Este é meu primeiro livro do autor, então não tenho uma referência para compará-lo aos outros livros do próprio. Contudo, é longe de ser meu primeiro livro de terror ou primeiro legends de Star Wars. Li o livro em sua versão impressa, na língua portuguesa, tradução de Caio Pereira e publicado pela editora Aleph. Enfim, ao livro. Não fornecerei nenhum spoiler, quase tudo aqui está na sinopse, salvo alguns poucos detalhes que não são impeditivos da apreciação da trama.
Primeiro é preciso comentar a qualidade da impressão. Nisto a editora Aleph nunca me decepciona. O livro é impresso em papel de qualidade (Polen Bold 70g), sem nenhuma falha na diagramação. Neste, como em todos os livros da editora que li até o presente momento, não identifiquei nenhum erro de ortografia ou falha no alinhamento dos parágrafos ou outro tipo de erro na revisão, assim como nenhuma folha danificada ou erros de impressão. Adicionalmente, a arte de capa do livro é sensacional. Internamente o livro possui alguns pequenos detalhes significativos, como a imagem utilizada para cada novo capítulo. Apesar de ser sempre a mesma imagem, adiciona um toque interessante ao efeito do livro. Por fim, o livro vem com o próprio marca páginas, um pequeno sabre de luz de papel.
Vamos então falar da história em si. A sinopse do livro deixa claro sua proposta. É uma história de zumbis no universo de Star Wars, que ocorre durante a existência do império, antes dos eventos de uma nova esperança. Uma nave prisão quebra no meio de uma viagem até um planeta prisão, encontra um cruzador imperial abandonado e um grupo vai investigá-lo procurando partes para o concerto da nave. No meio do processo um vírus se espalha e pessoas começam a passar mal. O tipo de zumbi utilizado no livro – que mundo vivemos em que podemos até classificar tipos de zumbis e infecção original – é do vírus que se espalha pelo ar, mata e transforma em zumbi. Nisso entra o primeiro momento complicado do livro, no qual os personagens principais são simplesmente imunes a infecção via aérea por... porque sim. Ok, se o autor escolhe esse tipo de infecção ele meio que fica obrigado a utilizar esse recurso, mas não deixa de ser uma situação forçada. Que seja. O livro evolui relativamente bem no início, com bastante trabalho na tensão. Contudo, em um indeterminado ponto no meio do livro as coisas se aceleram e ficam mais distantes do conceito de horror e mais próximas de um livro de ação. As coisas ficam “claras” muito rápido, de forma que é difícil ser impactado pelo horror do livro. Em algum lugar isso se perde e, embora eu possa reconhecer que os PERSONAGENS estão com medo, eu mesmo não senti nenhum incômodo. Talvez as minhas referências em Edgar Allan Poe e Stephen King tenham me imunizado de livros do gênero, mas o típico suspense e nervoso que tenho ao ler um livro desses autores não foi sentido nesta obra de Joe Schreiber. Como disse, por ser a primeira obra dele que leio, não posso dizer se chega a ser uma falha do autor, pois o universo utilizado talvez seja pouco propenso ao gênero. Contudo, houve algumas escolhas do autor que eu considero que poderiam ser mais eficientes para o tema. Um é  o uso dos zumbis “modo horda” ao invés de isolados. Regra geral, um monstro dá medo. 30.500 monstros, não. Eles se tornam comuns, e eu eventualmente não via mais problema em ter um mar de zumbis constante seguindo alguém. Segundo ponto que não gostei foi a introdução de alguns personagens famosos de star wars. Por mais que seja um elemento... interessante, é difícil inserir os personagens escolhidos no contexto do medo. Entre outros, você sabe que estes personagens são imortais, a prova de blasters e não sofrerão sequer um arranhão que poderia deixar uma cicatriz neles, o que impede a imersão. Por fim, a história tem uma série de elementos “Ex Machina”. Inúmeras vezes, entre os mais de 30.000 zumbis – considerando a tripulação de um cruzador imperial – aparece justamente o que tinha um contexto com os sobreviventes antes da infecção. E em algumas situações isso é simplesmente feito de formas impossíveis. Muito impossíveis. Absolutamente impossíveis. E isso gera descrença que, mais uma vez, afasta o medo.
Apesar disso, removido a consideração de “livro de horror”, e considerando um livro de ação, a história chega a ser bem interessante, com momentos bem emocionantes. Os personagens são bons e evoluem bem, apesar de um deles ter uma evolução muito rápida no meu gosto. A maior parte das decisões feitas pelos personagens é condizente com suas personalidades e críveis para as situações, mesmo considerando os momentos ex machina. Lendo sob esta ótica o livro é bom. Não sensacional, mas bom o suficiente para proporcionar um tempo agradável, com alguns momentos muito bons, mesmo que não o suficiente para tornar o livro um espécime singular.
A conclusão do livro, talvez, seja o ponto que força ele para o campo do regular. Como ocorre com muita freqüência, após construir uma trama tensa e com muitos nós, a solução final é meio “simples”, como se o autor percebesse que alcançou a quantidade de páginas pretendida e simplesmente precisasse encerrar em três capítulos do jeito que fosse. Mesmo assim, o final é bem interessante e satisfatório. O epílogo, em bem verdade, foi um dos meus momentos favoritos no livro, digno de uma história épica, o que aumentou um pouco minha consideração.
Concluindo, Troopers da morte é um livro bom, apesar de falhar na proposta de gênero original. Recomendaria principalmente para quem gosta de livros de ação. Eu daria uma nota de 6/10 para o livro, bom o suficiente, mas não espetacular. Compre em uma promoção e valerá a pena, mas não precisa correr para fazê-lo.

Ja-ne. Até a semana que vem devo acabar a leitura de outro livro, a Lenda de Ruff Ghanor, e informo o resultado.

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Onishiroi Shonin

terça-feira, 7 de junho de 2016

Um poema rápido

Deixe-me contar uma coisa rápida.
Tem que ser rápido, muito, muito
rápido. Porque nesse momento
bem ali perto, talvez,

uma pessoa lamuria-se numa mesa de bar
alguém encontra o amor da sua vida
e outra perde definitivamente o seu.

Alguém certamente chora esse momento
ou apenas talvez penteie o cabelo.

Pelo menos para alguém, sei
este momento é e foi
o momento mais importante
de toda sua vida.

Era só isso.

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Onishiroi Shonin

segunda-feira, 9 de maio de 2016

BIRDEMIC!!!

Como falar de certas coisas? Quando eu vi The Room eu pensei, após o filme, longamente, sobre como o que foi visto não pode ser desvisto. E, The Room foi uma das poucas coisas na vida que me deu essa vontade. É um filme que meio que tira sua fé na humanidade, que dá um vazio no coração e uma dor. Faz você perguntar o que está fazendo com sua vida para ver um filme desses.
Aí eu vi Birdemic. Em uns cinco minutos de filme já estava querendo ver The Room novamente. Sei lá, umas oito vezes, fácil.
Birdemic tem todas as coisas ruins que um filme poderia ter se tentasse. Eu vi peças escolares em que todos os atores estiveram obrigados a participar que tinha melhor interpretação. Além de que... bem, vamos por partes.
A primeira coisa notável do filme é que não existia um cameraman. Aparentemente o diretor aprendeu o botão que ligava a câmera e considerou suficiente. Isso porque existe falha de foco, a gravação se move quando não precisa e fica fixa quando poderia se mover e... bem, não existe enquadramento. A segunda coisa notável é meio que um colateral disso. Não existem microfones. O fone utilizado é o da câmera. Com a captação de todo o ruído da cena, pois não havia isolamento. E isso gera situações que dão a mesma sensação de quando alguém arranha o quadro negro. De novo. E de novo. Porque toda vez que a câmera muda, você SENTE o áudio no fundo mudando. E, claro que um filme sem cameraman e sem microfones não tinha um técnico de edição. Então muitos diálogos ocorrem assim:

*câmera fica na direção de um personagem. Ruído 1 no fundo*
*passam três segundos*
*personagem fala uma frase, talvez inaudível por causa do ruído. A câmera balançando faz uma parte ficar mais alta que a outra*
*passam mais dois segundos*
*câmera muda de personagem, com um audível CLIQUE da transição de ruído de fundo, e você passa a escutar um ruído de fundo completamente diferente*
*passam mais três segundos*
*personagem subitamente sorri, faz ha... ha... e fala uma frase, ininteligível*
*mais três segundos*

Praticamente todas as linhas são assim. Mas os diálogos não são o importante, porque 60% do tempo do filme é... um carro andando. Não, não aquela cena acelerada dos carros passando para dizer que o tempo passou. Um carro andando. Existe uma parte na qual o personagem principal (definido como referência somente porque o carro não candidatou-se) sai de casa. Vai até o carro. Desliga o alarme. Abre a porta. Entra no carro. Fecha a porta. Liga o carro. Engata a marcha. Manobra para a rua. Dirige pela rua. Faz uma curva. Anda por um tempo. Para em um posto. Abastece o carro (com uma pausa da câmera no preço da gasolina por uns 20 segundos). Volta a dirigir. Anda mais um pouco. Mais um pouquinho. LIGA A SETA (quando você viu um carro ligar a seta EM UM FILME!!??). Faz outra curva. Anda mais um pouquinho. Para. Desliga o carro. Abre a porta. Sai do carro. Fecha a porta.
Caso tenha parecido muito devagar e pausado... é porque é mesmo. Este personagem parece o robocop após um acidente grave fazendo fisioterapia. A fisioterapia é apenas um paliativo contudo, ele não tem cura mas dizem para ele que ele tem e então ele acredita.
O autor diz que o filme é um Romantic Thriler. Não só é nesta ordem como a definição de romantismo dele vem de uma mistura de filme pornô (sem o sexo) junto com lendas urbanas de ladrões de rim. Quando o personagem principal aborda a sua contraparte romântica do filme pela primeira vez, além de contracenar com a melhor atriz do filme (entre outros porque logo percebeu que o que estava fazendo era absurdamente ruim e passou a se divertir com isso), LITERALMENTE parece um filme pornô ruim sobre ladrões de rim. Até as partes que não são dele interagindo com ela parecem tiradas de um daqueles livros de literatura erótica que vende nas bancas de jornal, sem o erotismo (incluindo o amigo do personagem principal que quando ouve que ele está saindo com uma garota mas ainda estão "somente se conhecendo" utiliza a épica frase "Um dia sem sexo é um dia perdido").
Um outro ponto muito complexo do filme é o tempo. Não existe marcação clara de passagem do tempo. O que vemos é que o personagem principal conhece a menina, depois trabalha e faz um super negócio no trabalho. Algumas cenas depois a empresa é vendida por um bilhão de dólares (sim, um bilhão, com b) e, como acionista, ele ganha uma participação desconhecida. Logo depois ele aparece vendo TV em casa, e em todas as vezes que a TV aparece é para um noticiário (não vou comentar a qualidade desses noticiários, faltam-me palavras para isso, e eu lia dicionários para passar o tempo) falando de desgraças por causa do aquecimento global. Logo depois ele compra um painel solar para sua casa. Na cena seguinte ele tem uma startup que tem uma tecnologia incrível para fazer painéis solares que custam 20 vezes menos do que o que ele acabou de comprar, e convence investidores a injetar 10 milhões de dólares na startup (lembrando que logo antes ele recebeu uma parte não discriminada de 1 bilhão). E ainda logo depois ele está conversando com Nathalie, a sua contraparte no Romantic do filme, falando que a conheceu há apenas uma semana.

Resumindo:
Em SETE dias esse cara:
Fez o melhor negócio da sua vida na empresa.
A empresa foi vendida por um bi.
Criou uma consciência ecológica vendo tv.
Comprou um painel solar de US$ 19.000,00 (ele consegue um desconto de 1k)
Monta uma startup para fabricar painéis solares.
Desenvolve uma tecnologia 20 vezes mais eficiente que os painéis solares do mercado.
Consegue um venture para sua startup de 10 milhões.
Conhece a mãe da sua namorada (nem citei isso, porque a mãe consegue ser pior atriz do que os carros. Aliás, o link nesse caso foi comentado).
Não faz sexo, nem rouba rins. Got me.

O filme tem também no meio disso um encontro duplo (porque calha da melhor amiga da garota ser namorada do melhor amigo do herói, o Sr. dia sem sexo = dia perdido... aliás, essa dupla é um copy-paste de Jhon Lennon e Yoko, pois a garota é oriental e eles adoram falar de paz e de sexo, incluindo uma cena de... a gente finge que é sexo, mas... não. Enfim. Em uma cena dessas a câmera fica trinta segundos olhando um cartaz escrito IMAGINE PEACE. Cheguei até a achar que era o nome de uma empresa, sei lá), uma cena de "dança" de três minutos (não entende o que tem de errado? Lembra quando falei da performance do personagem principal, robocop, fisioterapia? Consegue imaginar isso dançando? Nem ele, que ficava tentando virar a cara para a câmera não velo, e fazia o proverbial "nada estalando os dedos". Ouvindo uma música que deveria tocar na prisão como tortura e todos teriam medo de serem presos para sempre)... um comentário sobre um filme que só eles viram que cria consciência ecológica, um show de abóboras e... outras coisas do gênero.

Então, subitamente, o casal principal decide que é hora de conhecerem-se biblicamente. E apesar de ambos serem pessoas solteiras, com suas próprias belas e grandes casas, decidem fazer isso em um motel digno dos filmes de Hitchcock. Nessa hora eu pensei que finalmente ia rolar a cena de roubo de rim que o início prenunciou. Mas ocorre só uma cena de "vamos fingir que é uma cena de sexo". Provavelmente esta cena é utilizada no treinamento de padres para estimular o celibatismo. E aí...

A cena seguinte mostra a cidade do alto, com várias... águias ou algo assim, eles foram feitos com efeitos especiais que... bem, lembram os patos de duckhunt. Fazem um som parecido também. ENFIM, a cena mostra esses bichos voando de um lado para o outro e... de repente um deles se lança para o chão (com um VROOOOOOMMM que lembra os aviões em jogos de Atari) e EXPLODE! FUCKING KAMIKAZIS-EXPLODING-EAGLES(thingies)!!! DEER LORD!

Após várias explosões com efeitos èspécïâís, os personagens acordam com uma águia bicando a janela (elas perdem a capacidade de explodir perto dos personagens principais). Os personagens, após evitarem a entrada da águia barricando a porta com a cama, decidem... sair. Afinal, não está seguro ali dentro. E a bateria do celular deles acabou e não podem pedir ajuda. Mas, claro, o personagem principal não consegue encontrar as chaves do carro, de forma que ele bate na porta de um vizinho. Vizinho de quarto de Motel. Um casal de vizinhos que não é o casal de amigos deles. E que convenientemente possuem uma van com cara de pertencer ao século anterior ao passado. E que também acham que é uma boa idéia sair daquele lugar seguro. E que, para evitar as águias no caminho até o carro decidem que precisam de armas. E então armam-se com cabides.
Eles ficam balançando cabides no ar, contra águias mal feitas que eles não conseguem ver (isso nunca foi tão notável) até o carro e então saem dirigindo. Frequentemente com as janelas abertas porque as águias não gostam de atacar vans. Ah sim, eu não falei que dentro da Van desse cara tinha um fuzil e uma pistola, além de aparentemente balas suficientes para o apocalipse zumbi né? É um filme americano, claro que eles andam com armas automáticas nas suas vans. O indivíduo também é um ex soldado que lutou no Iraque e cansou-se de toda a matança, para o filme ter outra chance de falar de paz e alguém usar a frase “Why don’t we give peace a chance?”. No meio do apocalipse. Claro.
Daí em diante... como disse, é um Romantic Thriller, nessa ordem. Então o Romantic acabou, porque já, supostamente, houve sexo, e ocorre apenas Thriller. A definição de Thriller do autor do filme envolve:
- Carros dirigindo bem devagar. Frequentemente por estradas que eles não podiam bloquear para filmar um filme Z então outros carros ficavam passando ao lado normalmente.
- Paradas para reabastecer e pegar lanches em lojas de conveniência. Não, nunca pensam em estocar suprimentos porque o apocalipse zumbi pássaro está acontecendo, eles só param quando ficam com fome mesmo.
- Cenas dos dois homens atirando para cima e de pássaros morrendo as dúzias. Realmente acho que eles roubaram as cenas dos pássaros morrendo direto de Duck Hunt.
- Picnic ao ar livre. Sim, durante o apocalipse pássaro. Não, eles nunca vão para casa. Nem pensam em ver a mãe da personagem principal.
- Uma conversa com um cientista que sabe que o aquecimento global fez os pássaros ficarem com gripe aviária, mas não faz idéia de porque eles ficaram violentos. Mas também sabe que evidências indicam que isso já aconteceu na era dos homens das cavernas e os pássaros arrancavam os olhos das pessoas, as vezes deixando-as feridas e voltando para matá-las apenas depois. No filme elas só matam mesmo.
- Crianças comendo doces.
- Carros andando.
- Abastecer o carro.
ANNNNND, that’s pretty much it. THRILLING. Após algum tempo pessoas morrem, uma atacada por um pássaro enquanto... bem, decide sair da Van para cagar. Não pode ser utilizados outros termos uma vez que o diálogo que transcorre é:
Nem as pornôs chanchadas brasileiras (cenas fortes) conseguem vencer esse diálogo! Algum tempo depois, em outra morte, descobrimos que os pássaros tem a capacidade de CUSPIR ÁCIDO (ou ao menos é o que eu e muitos outros acreditam. Apenas olhando a cena não sei se foi isso ou alguém decidiu jogar um balde de molho de galinha nas pessoas de repente). Mas sem problemas, eles nunca mais fazem isso. Tem também uma pausa numa floresta aonde encontramos um hippie protetor das árvores, com mais um discurso de como o aquecimento global está acabando com o mundo. Mas somos interrompidos pelo rugido de um leão da montanha (!), e na fuga a floresta começa a pegar fogo (!!) em vários lugares ao mesmo tempo (!!!), totalmente em efeitos especiais (!!!!).
Mas e aí? Bem... para o clímax do filme... as águias vão embora. Assim, simplesmente. Elas chegam a um consenso “Ei, acho que eles já entenderam o recado. E esses caras são legais, ele acredita em energia verde. Vamos migrar?” e vão embora. Ao fim, a cena dos sobreviventes na praia olhando o mar durante quatro minutos quando passam os créditos chega a ser um alívio. Ainda me espanto mais ao perceber que, apesar de menos qualidade que as fitas de meu aniversário de seis anos, o filme é de 2010 (e, sim, eu já não tenho seis anos faz muito tempo). Digo mais.

Existe um Birdemic 2. Se eu não voltar em duas horas, a sequência derreteu meu cérebro. Ja-ne folks.

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Onishiroi Shonin

terça-feira, 26 de abril de 2016

Horas ordinárias

Eu amo os números e estatísticas
nos quais me regalo pelas notícias
todos os úteis de minha vida dias.

Tenho prazer em manipular palavras,
como um senhor do universo, usá-las.

Dentro do meu terno e sua risca de giz
contudo, permaneço absolutamente infeliz.

Porque eu chego em casa ao fim
e não encontro você, simples assim.

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Onishiroi Shonin

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Você elegeu o impeachment

Hoje eu quero falar com você sobre uma coisa séria. Você talvez esteja comemorando a votação dos deputados. Talvez você esteja revoltado. Talvez você decida ignorar. Talvez você proteste dizendo que 513 deputados não podem tomar decisão por 190 milhões de brasileiros. Pois bem. Eu queria dizer que o que aconteceu na câmara este domingo é exatamente o resultado do seu voto. E do meu. E também do voto de quem não votou. Não está fazendo sentido? Eu entendo, é por isso que escrevo muito. Gosto de detalhar tudo. Então vamos explicar.
É necessário entender um pouco da estrutura política do nosso país, algo que, assustadoramente, é ignorado pela maioria absoluta da população. Eu mesmo não sei tanto assim, apenas sei o bastante. Nosso governo é um sistema montado por um povo que saiu de uma opressora e absolutista ditadura. E por causa disso, é um sistema que dá amplos poderes a vários poderes para poderem restringir os outros poderes (bizarro né?). A idéia final é: Ninguém consegue guiar o país para lado nenhum sozinho, não importa aonde esteja. Algumas posições tem uma autonomia relativamente maior, como os prefeitos. Mas o/a presidente? Quase toda proposta dele/a precisa ser aprovada pelos deputados. Ele/a pode usar artifícios para impor sua vontade, como as medidas provisórias. Contudo, elas podem igualmente ser vetadas pelo congresso. Além disso, muitas votações do congresso funcionam pelo sistema de maioria absoluta, ao invés de maioria simples. Isso significa que muita coisa precisa de 2/3 dos deputados para ser aprovada, ao invés de somente metade. Assim, negar algo é muito mais fácil do que fazer algo. Claro, a presidência tem alguns poderes diretos, como a indicação dos ministros, que possuem poderes significativos, e outros cargos relevantes. Contudo, o ponto importante é: Sozinho/a, um presidente/a não consegue fazer NADA.
Em função disso, junto com a existência de 35 partidos ativos (e mais 20 querendo existir), a única forma da máquina política funcionar é com a câmara, o senado e o/a presidente entrando em algum nível de consenso. Se um grupo de deputados decidir que um presidente não governará, mesmo que eles não sejam a maioria, eles conseguirão, porque meramente por votarem contra conseguem impedir a maioria absoluta. Em um cenário IDEAL isso significa que as eventuais propostas caminharão para um meio termo. No cenário NÃO IDEAL, significa que um grupo disposto consegue quizumbar a porra toda.
As vezes é difícil saber a diferença, quando o povo elege o Tiririca.
Aham. Esse processo de consenso manifesta-se já nas eleições. Dois partidos grandes preferem aliar-se a brigarem, porque não só possuem mais condições de ganhar uma eleição com seus votos combinados, como também conseguem direcionar o governo para algo no meio termo do que ambos acreditem. Separados, não poderão nem elegerem-se, nem governar. Assim, vemos as chapas sensacionais nas eleições que combinam alguns partidos grandes e uma dúzia de pequenos cada. Quando então votamos no candidato dessa chapa, votamos não só numa pessoa ou num partido, mas em toda a coligação envolvida.
Acompanhou até aqui? Ótimo. Agora vamos falar de uns números, ok?
Um argumento que tem sido muito usado é que o PT foi o partido que chegou ao poder na figura do presidente, e que o PMDB, seu ex-aliado, nunca teria sido capaz de chegar lá. Pois bem, vamos considerar o seguinte. No presente momento, existe na câmara dos deputados 70 membros do PT (Lula), 66 do PMDB (Temer) e 54 do PSDB (Aécio), sendo estas as três maiores bancadas (a quarta, PSD, já tem “somente” 36 cadeiras). Essa aproximação dos números deixa bem claro que:
1)  O PMDB possui uma participação expressiva, logo, recebeu votos de forma expressiva.
2)  A divisão partidária na última eleição foi enorme. Essencialmente, quaisquer dois desses três partidos que decida quizumbar tem como impedir completamente o governo de fazer qualquer coisa.
Segundo ponto sobre a “votabilidade” do partido Temer. Uma forma interessante de saber quantos votos um partido tem é simplesmente ver quantos afiliados ele possui. Afinal, quanto mais engajamento direto um partido consegue atrair, maior é, por extensão, o alcance popular que ele tem. O Brasil tem 6 partidos com um número de filiados entre 1 milhão e um milhão e meio. O PT possui 1.588.528 filiados. O PSDB, quarto em número de filiados, tem pouco mais de um milhão e quatrocentos mil filiados, pouca diferença. Contudo, o primeiro lugar é do PMDB com 2.374.909. Uma larga vantagem.
Terceiro ponto. Já podemos assumir que o PMDB possui um forte cabo eleitoral. Contudo, não lançou um presidente, ao invés disso, apoiou o candidato PT, em uma chapa cujo nome já esqueci, e em troca disso ficou com a vice-presidência. Se por um lado eles não conseguiriam eleger sozinhos um presidente, o PT igualmente não conseguiria sozinho. Embora não haja uma forma de levantar uma estatística precisa que permita dizer quantos eleitores da Dilma eram PMDebistas, levando em conta os dados acima, e a incrível proximidade que os candidatos finais ficaram na eleição presidencial, podemos concluir que o apoio deles definitivamente elegeu o PT.
Contudo, alguma coisa aconteceu, eles brigaram, e a coisa desandou. E aí começa a ficar complicado. Mais complicado. Isso porque, como falei, a eleição foi extremamente apertada. Razão pela qual a câmara possui três poderes com números tão próximos. Para o governo ocorrer é preciso que dois desses três poderes entrem em consenso e ainda consigam convencer uma boa parte dos outros partidos com pequenas participações a segui-los. E como são MUITOS partidos, fica mais e mais difícil agradar tantas ideologias diferentes. Uma das formas que o PT tentou para resolver isso foi com os ministérios, criando múltiplos para dar cargos de poder para todo mundo e conseguir o apoio. Outra foi o mensalão. Mas desse eu falo depois.
Então o país parou. Entenda. Sim, muita coisa errada no campo econômico foi feita no passado. Contudo, um agravante foi que, quando a bomba explodiu e decisões precisavam ser tomadas, o governo estava parado porque ninguém concordava com ninguém. E a culpa disso é nossa, porque não conseguimos também nos decidir na hora de votar. O corpo político de um país é meramente a extensão de seu povo. Seja por quem votou a favor, contra ou absteve-se, o resultado de nossas múltiplas ideologias sem acordo comum foi um governo sem acordo. E cerca de um ano e meio solto no mar com ninguém conseguindo mover o leme.
Nessa situação de estresse, veio o impeachment. Novamente, vale lembrar como ele está ocorrendo. A base legal do impeachment (já notou que impeachment quer dizer “Eu sou pêssego menta” em inglês?) em curso é... frágil. São argumentos válidos, mas fracos. As acusações envolvem ou coisas que não ocorreram neste mandato, ou coisas que são ambíguas. As pedaladas fiscais são uma coisa interessante (se você não sabe o que é pedalada fiscal ainda, pergunta que eu faço um texto sobre isso). Ocorreram? Sim, ocorreram. Contudo, sempre ocorreram, e nunca foram consideradas como um crime de responsabilidade fiscal. Levantar isso como um argumento agora é forçar um pouco a barra. Contudo, foi feito. E porque foi feito? Por golpismo?
Não. Foi feito pela necessidade de consenso no governo. Para o país continuar, precisamos encontrar algo com o que 2/3 dos deputados concorde, e 51% dos senadores. E, pelo andar da carruagem, a única coisa que conseguiu isso (ainda não sabemos do senado mas...) foi o impeachment. Não que isso seja garantido, porque mesmo que Dilma caia e Temer assuma, ainda tem gente o bastante desgostando dele para arriscar ele cair também... consenso não é bem a palavra de ordem. E cada um que votou esse domingo foi eleito pelo seu voto (ou pela falta dele) e com isso recebeu de você o poder de exercer a SUA vontade. O que leva a outro argumento absurdo...
Várias pessoas, inclusive deputados, argumentam que a câmara não tem o direito de votar o impeachment e que somente uma nova eleição deveria fazer isso. Esse argumento é tão bom quanto a de que tudo que é votado na câmara deveria ser votado por todo o povo nas urnas. O motivo pelo qual elegemos deputados, senadores, vereadores e etecetera é justamente escolher pessoas que estejam alinhadas com nossos valores e os exerçam na administração pública, enquanto voltamos nosso tempo para outras atividades, como se matar de trabalhar para pagar a escola da filha.
O que, mais uma vez, diz muito sobre um povo que vota no Tiririca.
Então, se você tem muitas opiniões sobre o que está acontecendo na câmara, saiba que é conseqüência DIRETA de nossas escolhas na urna. Quando eu votei, sabia que quem fosse eleito teria um governo difícil e quase impossível, porque a divisão pública era tangível. Assim como argumentei para quem me perguntava da Marina na ocasião que, mesmo que por uma aleatoriedade ela fosse eleita presidente não possuiria governabilidade nenhuma, uma vez que muitos de seus eleitores na ocasião não eram genuínos partidários dela, e estavam elegendo representantes de outros partidos, enquanto que a própria não possui (ainda...) a articulação política para ter muitos aliados. Neste momento, precisamos de articulação política, porque até para decidirem afundar o país de vez precisam de consenso. E, absurdo seja, com o tamanho do PMDB e com a articulação política que possuem (você não conhecia o Temer? Engraçado, quase todos os políticos conhecem), sejam possivelmente capazes de conseguir isso.
E... maldito é o povo que tem como mestres políticos Temer, Cunha e Calheiros. Nem cito o Maluf, é um mito a parte. Mas querendo ou não, isso é culpa nossa.
Antes de finalizar, sempre é bom lembrar. Você sabe em quem votou? No site da câmara você pode ver tudo que ele propôs, votou e fez: http://www2.camara.leg.br/ Pode também usar as interfaces para falar com ele/a, se quiser propor ou cobrar algo. Tem muito mais chance de funcionar do que reclamar no face. Se você votou numa legenda partidária, como eu, tente acompanhar a direção que seu partido está seguindo ao menos. Interesse-se.

Ou então, claro, você sempre pode escolher deixar isso de lado. Mas se for fazer isso, por favor, pare de ficar dizendo #ÉGOLPE #NÃOÉGOLPE por aí como se não tivesse nada a ver com isso.


Referências para os números utilizados:
http://g1.globo.com/politica/eleicoes/2014/noticia/2014/10/veja-os-deputados-federais-eleitos-por-estado.html
http://www.tse.jus.br/eleitor/estatisticas-de-eleitorado/filiados
http://www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos

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Onishiroi Shonin

terça-feira, 29 de março de 2016

Petrobrás, Lava-Jato, Fifa e... máquinas de lavar



A recente onda de prisões e escândalos feita pela Lava-Jato no Brasil levou uma série de pessoas a levantarem bandeiras contra a corrupção. Nunca na história deste país tantos casos de desvio de recursos públicos e privados fez-se tão evidente. Com isto, existem aqueles que acreditam que nunca se roubou tanto na história, ou que até mesmo acreditam que governos anteriores não foram tão corruptos (para quem acredita nesta última premissa, uma informação assustadora: Os ovos de chocolate que você recebeu não vieram do coelhinho da páscoa, sua mãe que comprou). Contudo, para quem compreende que SEMPRE houve corrupção e, mais especificamente, sempre houve crime na história da humanidade, cabe a pergunta: Porque de repente tantos casos de corrupção apareceram na mídia?
Para começar, é necessário observar que a tendência em questão é global. É fácil ver somente a lava-jato e esquecer o que ocorre no mundo, mas uma pesquisa rápida demonstra que, nos anos recentes (e por recentes digo um período de três a seis anos) houve investigações bem sucedidas de casos de corrupção envolvendo políticos na França, Malásia, Brasil, Itália, Fifa (sejamos honestos, membros da Fifa contam como políticos), para listar alguns. O que mudou então para que de uns poucos anos para cá tenha ocorrido uma explosão de investigações de corrupção, e elas tenham cada vez mais terminado em prisões? Para poder explicar isso terei de voltar alguns anos no tempo e falar sobre o problema mais clássico e eterno de todo criminoso. A lavagem de dinheiro.
Lavagem de dinheiro é a parte mais complexa de quase todo crime. Pense assim. Uma pessoa pode roubar um banco e, da noite para o dia, passar de pobretão para milionário. Contudo, ter milhões em dinheiro vivo dentro do armário só tem utilidade se você pode gastar esse dinheiro. Se essa pessoa que vivia em um conjugado alugado repentinamente compra uma cobertura no Leblon, imediatamente será levantada a questão da origem do recurso. Se a pessoa não consegue dar uma explicação justa e legal (legal juridicamente, não legal bacana), infere-se que o recurso tem origem ilegal e investigações começam. Lavagem de dinheiro então é o processo de pegar esse dinheiro do crime e dar a ele uma origem honesta e justificável. O termo “Lavagem de dinheiro” tem origem não confirmada e quase pitoresca. Alguns alegam que ainda no tempo em que quase toda transação era em notas e a falsificação de notas ainda era uma coisa comum (hoje isso é mais raro, pois não só é muito mais difícil a produção como as notas são muito mais controladas). Para evitar que as notas fossem identificadas como falsas, seus “fabricantes” supostamente colocavam as notas em máquinas de lavar roupa, pois após uma ou duas rodadas na máquina as notas saíam com aparência de velhas e desgastadas. Como notas velhas chamam menos atenção que as notas novinhas, elas eram mais fáceis de passar desapercebidas (similar ao antigo processo de “grilagem” no Brasil para dar validade a documentos falsos criando uma aparência de antigos). Outra hipótese, já mais complexa, é a de que muitas redes criminosas utilizavam estabelecimentos de lava-roupas com objetivo de criar origem para os recursos. Este caso já é confirmado como real e cabe explicar como funciona.
A idéia é simples, mesmo que a execução seja complexa. O criminoso, no próprio nome ou em nome de um laranja (termo técnico para testa-de-ferro. Sério, é um termo técnico) abre uma loja relativamente pequena, como uma lavanderia. Esse empreendimento é interessante porque exige pouco investimento, apenas o aluguel de um local e a compra de algumas máquinas de lavar, então o dito criminoso consegue fazer isso com uma justificativa de que tinha esse pequeno recurso originalmente. A partir de então a dita loja gera uma certa receita X. Contudo, como as transações comerciais dessa loja ocorrem todas em dinheiro vivo, não existe um produto final entregue que possa ser contabilizado nem registros claros, é fácil para o dono desta loja declarar uma receita maior, digamos, 2X. Claro, ele pagará impostos sobre esse valor, mas poderá incorporar parte daquele dinheiro ilegal no seu patrimônio com uma origem “honesta” de forma que não gere suspeitas. Lavanderias continuam sendo muito utilizadas para lavagem de dinheiro, mas igualmente são várias outras atividades que utilizam principalmente dinheiro vivo em suas transações e/ou não tenham um produto final tangível e contabilizável. Por exemplo contrário, é praticamente impossível lavar dinheiro com uma indústria de bebidas no Brasil, uma vez que é fácil controlar quantas garrafas de determinada bebida podem ser produzidas com base nos insumos comprados pela empresa, como também uma lei exige a instalação de máquinas que contam quantas garrafas são produzidas de cada bebida, máquinas estas controladas pela Casa da Moeda. Assim, inflar a receita de uma indústria de bebidas exige adulterar e subornar muita gente, além de grande investimento inicial na fábrica em si. Em paralelo, negócios muito simples para lavagem de dinheiro envolvem táxis, aonde basta comprar alguns veículos (possivelmente usados e possivelmente também de origem ilegal), algumas licenças de taxímetro e pronto. Faz-se uma rede e, como muitas corridas de táxi ocorrem em dinheiro, é fácil fingir corridas que não existiram. Outras formas simples são lava-jatos (como ocorreu em Braking Bad), ourivesarias e joalherias, empresas de consultoria, bingos e cassinos, botecos e assim por diante. Contudo, como falei, este processo é absurdamente complexo, muito mais do que o próprio crime. Pense um pouco e você poderá lembrar pelos filmes que já viu quantas histórias de criminosos sendo presos envolvia esse processo. Scarface e Al Capone são alguns bons exemplos. O processo de lavagem de dinheiro é complexo não só por seu custo e processo, mas também porque, mesmo que seja executado corretamente, possui limites. Em Breaking bad existe o momento no qual Heisenberg possui mais dinheiro sujo do que poderia lavar em toda uma vida. Se cometesse o erro de colocar números altos demais no lucro falso do lava-jato, despertaria suspeitas e acabaria sendo pego. Similarmente, muitas investigações da operação lava-jato chegaram em pessoas que tinham recursos muito elevados vindo de consultorias que não tinham porte nem serviço para tal e, assim, despertaram atenção.
Ok, agora que conversamos sobre o básico da lavagem de dinheiro, voltamos a pergunta: O que houve que, de três, quatro anos para cá, tanta corrupção foi descoberta no mundo? Existe uma série de motivos, que foram encadeando-se e gerando uma bola de neve. A primeira causa, e que compõe uma constante eterna, é a simples digitalização do dinheiro e a facilitação do controle. A cada dia menos dinheiro circula em moeda e papel, e mais circula digitalmente. Se por um lado é fácil dizer que foram recebidas mais notas em uma corrida de táxi, não é possível dizer que houve mais pagamentos via cartão de crédito, uma vez que é fácil conferir se houve a contra parte da operação. Igualmente, vários produtos e serviços possuem pequenas taxas embutidas no seu controle que permitem saber o que foi produzido ou vendido, como o imposto sobre cada garrafa que comentei antes neste texto. Transações financeiras, de transferência entre contas até a venda de ações igualmente gera informes, comunicados e controles que podem ser acessados pela receita, alguns nem precisando de quebra de sigilo bancário. Este aumento de eficiência do controle por si só já melhorou em muito a capacidade de rastrear eventos de lavagem de dinheiro. Contudo, isto somente não seria o bastante. Muitos casos que começam com esse processo de investigação de lavagem de dinheiro não eram capazes de chegar ao crime original, apenas descobrindo dinheiro de origem duvidosa, sem a confirmação final, e terminavam com multas inibitórias ou pagamentos vultosos de imposto, mas sem outra conclusão. No máximo conseguiam prender um testa-de-ferro, que no fim estava lá para isso mesmo, e raramente conseguia se chegar à pessoa final que originou e recebeu estes recursos.
Curiosamente, um segundo ponto crucial para o avanço do combate à corrupção foi... a crise. Da mesma forma que quando uma pessoa encontra-se com falta de dinheiro ela busca notas embaixo do colchão e lembra daquele empréstimo de cinco anos atrás para decidir cobrar e tentar algum retorno, os países também começam a procurar dinheiro em todos os cantos. Isso fomenta as atividades de recuperação de recursos, o que inclui a busca por esse dinheiro sujo que passou pela máquina de lavar. Essa busca, contudo, mira no volume grande, nos desvios milionários, e poucos são maiores do que os que ocorrem em desvio de dinheiro público. Ao rastrear esse dinheiro, contudo, sempre chegava-se ao mesmo impasse. Podia-se ter evidências de que uma pessoa obteve dinheiro ilícito, mas, para confirmar, esse dinheiro precisava ser rastreado. E ao rastrear o dinheiro destes “big players” normalmente tropeçava-se nos mesmos problemas: Os paraísos fiscais. Paraísos fiscais são, essencialmente, países ou territórios com leis muito fracas de controle de recursos, ou mesmo inexistentes. Se no Brasil eu preciso preencher milhões de formulários e ter dados comprovados em inúmeras fontes caso eu subitamente surja com uma mala cheia de dinheiro querendo abrir uma conta no banco, nas Bahamas, em Mônaco e na Suíça, não. Não só podia abrir essa conta como esses lugares garantiam meu sigilo. Se um governo perguntasse em qualquer um desses países se eu tinha conta e exigisse a quebra do meu sigilo fiscal eles simplesmente negariam. Ponto. Entenda, eu poderia entrar em um banco suíço baleado, com uma camisa na qual estivesse escrito “Mafioso e orgulhoso” e armado (a arma ficaria na recepção, claro), depositar uma mala de dinheiro, alguns diamantes e o título de uma casa, e nada seria me perguntado, desde que eu pagasse os custos elevados deles. E... sim, os outros países reclamavam. Porém, não podiam fazer muita coisa, afinal, esses paraísos fiscais são países soberanos e donos das próprias leis. Aliás, não são chamados de paraísos a toa, uma vez que esses lugares constituem países ricos que vivem basicamente de bancos e turismo. Uma vez que milionários do mundo todo possuem seu dinheiro nestes locais e eles só podem usar o dinheiro lá, são normalmente paraísos turísticos além de fiscais. Não havia real pressão para essas informações bancárias, e era aceito o lugar destes paraísos fiscais no mundo, com algumas sanções leves.
Até 2010. Como disse, a crise pressionou muitos países a buscarem recursos aonde pudessem, e todos sabiam que havia muito dinheiro escondido nestes paraísos. E começaram a pressionar mais e mais por estas informações. Além de acusações diretas de bancos suíços participando diretamente de crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas, cabe notar o fato de que esses próprios países sofreram bastante com a crise. Uma vez que suas maiores receitas provinham do sistema bancário e de turismo, suas receitas foram abaladas sem grande capacidade de recuperação. E outros países aproveitaram a oportunidade para apertar esses paraísos. Em Março de 2010 os Estados Unidos oficializaram a legislação apelidada de FATCA (Foreign Account Tax Compliance Act). Essa lei diz, entre outros, que os outros países deveriam informar para a receita federal dos estados unidos a existência de contas em instituições financeiras de qualquer cidadão americano. Caso contrário, sofreriam sanções pesadas. Outros países não só começaram a aderir ao FATCA, como debateram acordos de mútua ajuda no processo. Assim, não só passaram a informar as movimentações dos americanos para os EUA, mas também receber de volta informações sobre seus cidadãos em solo americano. A seriedade desse processo foi tal que a Suíça aderiu ao FATCA. Com isso, mesmo que uma pessoa solicite ao banco sigilo bancário, ainda assim os bancos suíços informam o número de contas e o valor total delas. Quem permite a liberação de dados concede praticamente acesso total de suas movimentações para a receita americana (não acredita? http://bit.ly/1UzHc9p direto de jornal suíço).

Contudo, a partir do momento que “pequenos” criminosos e empresários são revelados por estas contas, igualmente ficou possível localizar grandes somas ocultas por corrupção em esquemas políticos e grandes empresas. Antigamente, bastaria todos negarem, e jamais poderia se provar os pagamentos alegados por Alberto Youssef para os políticos. Antes, jamais saberíamos se o Cunha realmente recebeu dinheiro porque não receberíamos a informação das contas na Suíça. Agora é possível questionar ao Cunha a origem dos recursos naquelas contas Suíças, uma vez que temos essa informação. E negar não é mais simples, pois existem provas da existência do dinheiro. O resultado disso, como vimos, é uma onda de investigações conclusivas sobre corrupção passando por todos os países. Isso significa que hoje estão roubando mais do que no passado, ou que antigamente não havia corrupção? Claro que não. Porém, é mais fácil essas informações localizarem o desvio novo do que o antigo. Isso vai acabar de vez com a corrupção? Igualmente não. Assim como os vírus, cada nova forma de prender criminosos resulta no extermínio de uma parte da população e na sobrevivência de um grupo resistente que se adaptou a estas medidas, seguida pelo desenvolvimento de novas medidas. Ainda assim, vivemos hoje o que provavelmente será, para muitos países, o fim de uma era, com o término de um ciclo de corrupção. Em muitos países, ao fim deste processo, teremos opiniões muito diferentes sobre nossos sistemas políticos. Certamente haverá, por um tempo, menos corrupção, pois será difícil passar impune. Infelizmente, por um tempo, enquanto adaptam-se e descobrem novas formas de passarem desapercebidos do sistema. E, pelo conceito de que a moda sempre se recicla, não estranharia nada se daqui a alguns anos subitamente descobrirmos que 90% dos nossos políticos investem em redes de lavanderias...

OBS: Estou usando um teclado US/International, no qual escrever Suíça exige digitar quatro teclas para fazer "íç". Quase desisti de completar este texto duas vezes por causa disso hehe

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Onishiroi Shonin

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Respostas rápidas sobre a Petrobrás e a gasolina

Antes de qualquer coisa, um disclaimer. Moisés não é economista, embora tenha ensinado conceitos de economia para muitos economistas. Moisés também não é analista de investimentos, embora tenha ensinado conceitos de analise para muitos analistas. Moisés é AAI e operador de BackOffice certificado pela bolsa, com seis anos de experiência no mercado financeiro. Assim, sou autorizado a passar recomendações de investimentos e executá-las, mas não de preços de ações. Para clientes meus interessados especificamente em ações eu repasso as recomendações do time de analistas certificados. Se deseja algum tipo de direcionamento sobre investimentos, fale comigo no pessoal.
Aham, agora que pulamos a burocracia, vamos falar mais uma vez de Petrobrás. Especificamente, vou tentar hoje explicar de forma simples algumas perguntas comuns sobre a empresa e também acrescentar outras informações que costumam aparecer no noticiário mas não são adequadamente explicadas, como porque a empresa é tão endividada, porque as vezes o dólar alto é bom e outras é ruim, e porque a gasolina no Brasil é tão cara e ao mesmo tempo vivem falando que ela é barata demais para a Petrobrás.
Vamos falar do preço da gasolina. Para isso, recomendo fortemente o http://pt.globalpetrolprices.com/. Eles possuem uma excelente comparação de preços médios atualizada com certa regularidade. Nós podemos com isso considerar o preço médio (considerando 11/01/2016 e dados oficiais) da gasolina no Brasil como R$ 3,65. Enquanto isso, nos Estados Unidos o preço é de R$ 2,41 e na Venezuela é R$ 0,06 (!). A média mundial é R$ 3,98. Existe uma série de motivos para estas discrepâncias e são os assuntos relevantes de hoje.
1)  Embora o barril de petróleo seja negociado em preço “padronizado” (isto é, o mercado internacional negocia valores similares entre si), cada país tem tributos e subsídios diferentes. Os Estados Unidos fornecem subsídios consideráveis para as empresas petroleiras, diminuindo o custo pelo qual elas precisam repassar a gasolina e outros produtos derivados ao consumidor. A Venezuela fornece subsídios absurdos, assim o baixíssimo preço. Por nosso lado, apesar da Petrobrás ser semi-estatal (já comentei anteriormente sobre o capital misto neste blog), nós temos impostos severos sobre a gasolina e outros derivados.
2)  A negociação do barril pode ocorrer em preços “padronizados”, mas o custo de produção e refino não é. O investimento necessário para abrir um poço é enorme e os retornos são... complexos. Isso tornou-se bem claro no caso da OGX, que após imensos investimentos para perfurar alguns poços, descobriu que deles sairia muito menos petróleo do que esperado. Esses poços continuavam produzindo barris, mas o custo total para extração de cada barril, contando todo o investimento, era alto demais para haver lucro na venda destes, o que tornou o negócio inviável. Algumas regiões produtoras possuem vantagem nesta linha por terem poços de fácil acesso, em lugares simples de escavar. Por nossa vez, temos muito orgulho de que a Petrobrás é a maior do mundo em exploração de petróleo em águas super-profundas. Ocorre que isto não é realmente um trunfo, e mais uma necessidade. O motivo pelo qual certas companhias não investem tanto quanto a Petrobrás neste tipo de exploração é justamente que ela é custosa, e havendo opção por poços mais simples, é o que fazem. Como nós temos uma grande quantidade de petróleo em águas super profundas, investimos muito nisso. E isso aumenta o custo de produção. Mesmo conseguindo extrair o barril, o processo é muito mais custoso e, por conseqüência, faz a necessidade de que o preço do produto final seja maior. O Pré-sal, tão comentado, é um caso de poços em condições tão adversas que a maioria das companhias de petróleo não estaria muito interessada na maioria destes poços, pois o custo deles é inviável. E isso nos leva a...
3)  Política de negócios absurdamente ruim. Parte disso eu comentei no post anterior sobre companhias de capital misto. A burocracia e as metas levam muitas empresas a ficarem em situações nas quais são forçadas a fazer um negócio ruim. Por exemplo, quando o Itaú e o Unibanco fizeram sua fusão, vários contratos comerciais foram violados. O Itaú tinha um contrato de exclusividade com o Pão de Açúcar no qual todas as operações do mercado eram com o Itaú e nenhum dos dois podia fazer essas operações com outro mercado/banco. Mas ao fundir-se com o Unibanco, o Itaú incorporou as operações de outros mercados, gerando quebra contratual e tendo que pagar uma multa violenta para o Pão de açúcar (R$ 600 milhões: http://glo.bo/1UUso0Z). No caso de uma companhia semi-estatal, o seu sócio controlador nem sempre foca em lucro. Com isso a Petrobrás teve que abrir refinarias em locais aonde não era economicamente viável com o objetivo de gerar desenvolvimento em regiões sub-desenvolvidas (antes que argumentem, isso acaba não desenvolvendo a região pois conforme o projeto dá prejuízo ele acaba parando ou não crescendo como deveria. Eu comentei isso em mais detalhe no post sobre capital misto). Outra questão é a obrigação de participar de certos negócios do pré-sal. Isso fez com que outras empresas entrassem como parceiras em negócios viáveis e deixassem a Petrobrás se virar tentando escavar poços não-rentáveis, mas que era obrigada a explorar assim mesmo, aumentando seu custo de produção.
4)  A balança cruel entre a variação cambial e o preço do barril de petróleo. Muitas companhias que trabalham com petróleo giram todo seu caixa em dólares. O barril é cotado em dólar e, nesse sentido, a variação cambial tem menos impacto para elas. Contudo, quando uma companhia tem seu giro principal em outra moeda, a variação cambial gera um efeito extra. Muitos compromissos da Petrobrás estão em dólar, tanto por obrigação quanto por estratégia. Afinal, com isso, o que afeta o barril afeta também a companhia inteira. Adicionalmente, a empresa faz operações para proteger-se de variação cambial como toda boa grande empresa. Em cenários normais, isso faz com que a variação cambial afete pouco a empresa. Contudo, em um período muito curto de tempo houve um aumento absurdamente alto do dólar ao mesmo tempo que o barril de petróleo caiu muito. Fosse só um ou outro, o movimento poderia se compensar. Os dois ocorrendo na brutalidade que foram geraram efeitos que nenhuma proteção poderia resolver. Ligado ao problema anterior da política de negócios que obrigou a empresa a realizar muitos investimentos antes de gerar o caixa necessário e por conseqüência realizar grandes levantamentos de capital (vulgo: Empréstimos) em dólar, a empresa fica numa situação em que seus custos encontram-se elevadíssimos.

Por enquanto, vamos deixar de lado a questão dos preços controlados. Falo disso quando for falar da inflação. O resultado destes fatores representa que, mesmo que o preço do combustível suba (lembrando que ele ainda está abaixo da média mundial, parecendo alto em relação contra países que fornecem subsídios para as produtoras), ele ainda será “barato” do ponto de vista da Petrobrás, pois seus custos de produção e necessidade de geração de caixa no momento (e sempre) estão elevados. Então, sim, a gasolina no Brasil é barata em relação ao padrão do mundo. Considerando todos esses fatores, seria esperado que o preço estivesse acima da média mundial, ao invés de abaixo. É óbvio que nenhum de nós gosta da idéia de ter um preço de gasolina elevado, contudo, argumentar que o combustível no Brasil é caro pode não ser a melhor escolha de palavras. Depois falamos da inflação e de como isso afeta sua vida e a relação entre inflação e falta de crescimento econômico.

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Onishiroi Shonin