quarta-feira, 14 de abril de 2021

Não tem mais

Não tem mais arroz.
Ou melhor, tem, mas o quilo
custa uma Alemanha no brasil.

O feijão também acabou.
Quer dizer, não acabou.
Mas é como se fosse
porque o dinheiro acabou.

O trabalho acabou.
A vida acabou.
A vacina atrasou.

Mas tem soja.

Quer dizer, meio que tem.
Tinha, vai ter mais ainda.
Logo mais.
Mas é como se não fosse
porque foi pra fora.

Eu nem gosto de soja mesmo.
E vendemos caro, pra ganhar bem.
Só que não tem arroz.
Quer dizer, tem, mas não tem.

Não pra mim, porque não vendo soja.

Eu queria ter soja.
Assim eu teria arroz, e feijão.
Ou um Iphone.
Ah, mas temos Iphone.

Mandaram, como pagamento pela soja.
Só que não para mim,
porque não tenho soja, nem arroz, nem feijão,
nem o um que sobrou depois da Alemanha.


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Onishiroi Shonin

sábado, 27 de março de 2021

Vinte e seis de março

Hoje, eu não escrevi um poema.
Porque ontem, me deram
três mil seiscentos e cinquenta
motivos para não escrever.

Por extenso, porque não é um número.
Não arredondo, porque não é um número.

Apesar disso, dentro de mim,
o grito
vira, fora de mim,
um suspiro.

Meus dedos cansados seguram a caneta
e firmam o papel.

Eu escrevi. Sim.
Mas, não um poema
por três mil seiscentos e cinquenta
motivos.


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Onishiroi Shonin

sexta-feira, 19 de março de 2021

Olvidar

Olhei pela janela, para cima.
Para longe do jornal, e das telas,
das notícias, de mim mesmo,
e longe daqueles que, logo ali,
seguiam adiante, em olvido.

Minto, pois que, olhos distantes
mas não de mim, ah!, mas não de mim.
Queria, no azul e branco e amarelo
(e no reto concreto de cor desbotada)
esquecer de mim
e do jornal, das telas,
das notícias, e daqueles
(que inveja daqueles)
seguindo adiante.

Fechando os olhos, pensei em algo bom.
Por um instante, fui um
com aqueles em olvido.

Mas não segui adiante.


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Onishiroi Shonin

quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

Meio de semana

Hoje eu queria ir naquela praia
na qual andamos juntos tantas
(e tantas e tantas e tantas)
manhãs soltas e livres da vida.
Nem sempre fazia sol, mas nas nuvens
sempre vimos que havia um sol.

Nós mudamos.

Pisamos na mesma areia como quase estranhos
e como conhecidos casuais
e como amigos de longa data.

De mãos dadas, naquela areia
como um casal.

Nós mudamos.

Hoje eu queria ir naquela praia
na qual andamos juntos tantas
manhãs soltas e livres da vida.

Só para ficar parado abraçando você
e sussurrando contra o explodir das ondas
que te amo te amo te amo te amo.

Mas, ah! deuses,
é quinta feira.


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Onishiroi Shonin